Capítulo 14

 

O grupo embarcou num dos navios de refugiados e partiu para Balad Naran onde foram recebidos em ambiente de festa. O pai de David recebia-os de braços abertos e planeara grandes celebrações para agradecer o retorno de seu filho.

David aproveitou para falar então com seu pai.

 

«Pai devo pedir-vos um favor.» disse David iniciando uma difícil conversa.

 

«Que quereis?» indagou o pai.

 

«Os deuses incumbiram-me de liderar as suas forças contra Rashagall.» disse David.

 

«Deuses?» perguntou o rei.

 

«Artanis e os deuses do Caos estão a reunir forças para lutar contra Rashagall.» disse David.

 

«Entendo.» disse o rei. «Percebo a escolha. Fostes vós o responsável pelo cessar de batalhas no Oeste devido ao medo e respeito que vos teem os nossos inimigos.»

 

«Terei de tomar posse de seus exércitos e por isso devo navegar para Oeste o mais depressa possível.»

 

«Sim.» disse o rei. «Será o mais aconselhável. Mas um navio para Oeste demorará pelo menos três dias a aparelhar.»

 

«Não é só isso meu pai.» disse David. «Deveis mandar meu irmão para liderar as nossas forças até chegarem todos os exércitos.»

 

«Mas teu irmão é tão inexperiente.» disse o rei.

 

«Tende confiança nele.» disse David. «Ele comanda os exércitos quando eu não me encontro e nunca deu mostras de desleixo ou cobardia.»

 

«Sim mas...» disse o rei.

 

«Pai!» disse David. «Ele conhece os sinais que combinei com os generais e saberá o que fazer. Preciso de vós aqui para liderar os exércitos que vos mandar e os dispordes no campo de batalha.»

 

«Entendo.» disse o rei. «Mas assim que todos os exércitos chegarem tomarei o comando até chegardes.»

 

«Sim meu pai.» disse David. «Assim que tomardes o comando tentai recuperar tanto território quanto conseguirdes.»

 

«Muito bem meu filho.» disse o rei. «Ficarão então para a festa?»

 

«Nunca perderia uma festa real de Balad Naran.» disse David sorrindo e abraçando o pai. «Vamos então aproveitar a festa.»

 

O palácio estava decorado de cores vivas e os povos de tantos reinos juntavam as suas formas de celebração á festa tornando-a um tornado de cultura quase mundial. Danças, música, comida tão diferentes quanto os povos mas no fundo tão semelhantes por pertencerem todas ao povo humano.

David e Freira nos seus resplandecentes fatos de gala presidiam ás homenagens e vivas de todos com prazer e simpatia. Mas essa noite seria de Raquel. O seu vestido brilhava sob a luz e a sua felicidade era tal que ainda hoje em Balad Naran se fala de uma princesa de Guildenhome que em noite de festa fez empalidecer o luar e as flores murcharam de vergonha por não conseguirem igualar a sua beleza. Fábio estava completamente surpreendido e ali naquele momento em que a vira entrar no salão apaixonou-se outra vez por Raquel. Os músicos a um sinal de Lígia começaram a tocar uma canção suave e Fábio tomou Raquel nos seus braços e dançaram sózinhos no centro do salão sendo olhados por todos em admiração e Fábio não resistiu mais e beijou os lábios de Raquel com a ternura de um jovem apaixonado pela primeira vez. Lígia sorria para os dois apaixonados enquanto todos aplaudiam aquele momento tão lindo que os fazia esquecer que estavam em guerra, ou que estavam exilados de seus reinos. Naquele momento só o amor imperava na sala e os dois amantes eram seus reis.

David e Freira juntaram-se a eles e dançaram também trocando por vezes de par. Lina fez então o impensável e puxou Bruno para o meio do salão e dançaram juntos, embora a maioria dos passos nenhum dos dois sabia e inventavam á medida que iam dançando. Era cómico mas ao mesmo tempo ternurento ver aqueles dois atabalhoados dançar. Ivandro dirigiu-se então a Carmen e de modo solene ofereceu-lhe o seu braço que Carmen aceitou graciosamente para surpresa de todos e dançaram sorrindo um com o outro. Luís e Filipe mesmo discutindo entre si decidiram também convidar Cátia e Rose para dançar e fizeram disso uma competição para ver quem dançava melhor sendo os seus pares as juízas. André ria a um canto ao ver os dois a competir nas danças mas um valente pontapé nos fundilhos fizeram-no cambalear para pista de dança e olhando para trás via Andreia vindo para ele e sem ter como recusar dançaram também. Num acto nunca visto o irmão de David convidava Joaninha para dançar e o próprio rei tirou Tânia do seu torpor e dançou com ela.

Todos se divertiram na festa e passados mais dois dias estavam num navio a caminho das terras do Oeste e dos exércitos das trevas.

 

«Sabeis que caminho tomareis?» perguntou André.

 

«Iremos aportar em Beleri primeiro.» disse David.

 

«Beleri?» indagou Andreia. «A terra das Sereias?»

 

«Sim.» disse David. «Fica mais perto.»

 

«Mas é também um destino perigoso.» disse Freira. «As histórias das suas canções são lendárias.»

 

«E de seu apetite também.» disse Carmen. «Perdemos uma vez dois navios que se aproximaram demais dessa maldita ilha.»

 

«Mas necessitamos de um ou mais de seus heróis.» disse David.

 

«Heróis?» indagou Tânia. «Existem heróis em tal lugar?»

 

«Para nós vilões.» disse Freira. «Nós somos também vilões para eles.»

 

«Realmente nunca tinha pensado nisso.» disse Andreia.

 

«Os humanos são como todos os povos um pouco egoístas na sua visão das coisas.» disse Lígia.

 

«Pode ser.» disse Filipe. «Para mim continuarão a ser vilões.»

 

«A cada qual a sua opinião.» disse Ivandro mostrando um lado mais filosófico da sua natureza.

 

«Concordo.» disse Raquel. «Uma frase muito bonita Ivandro.»

 

«E também sábia.» disse Fábio.

 

E assim a viagem continuou sem incidentes, mas á medida que se aproximavam de Beleri o tempo mudava. Não era uma tempestade que se aproximava era uma escuridão que rodeava a ilha e ao longe ouvia-se uma triste canção que parecia chamá-los ao seu encontro. Os navegantes de Balad Naran tinham já aprendido a cobrir os seus ouvidos com panos de maneira a bloquear a canção das sereias e a comunicar por sinais para não se perderem. E assim o navio chegou á enseada de Beleri.

Beleri era desoladora. Não passava de uma praia com um velho farol lá colocado de onde provinham as canções. Mas hoje tudo estava silencioso. Não havia vivalma na praia e o Farol quase demolido encontrava-se no maior dos silêncios.

Todo o grupo desembarcou e ficou espectante. Olharam o navio e estava cercado de cabeças humanas que os observavam. Os homens armados de tridentes e as mulheres desarmadas. Uma das mulheres de pele morena e cabelos pelos ombros aproximou-se da costa e ficou nas ondas de onde chamou o grupo a ela.

 

David retirou então as suas protecções e ao ver que nada ouvia excepto o mar pediu que todos fizessem o mesmo.

 

«Sois vós o que temos esperado?» perguntou a jovem com uma voz que lembrava uma maré de fim de tarde durante um por do sol.

 

«Sou David de Balad Naran.» disse David.

 

«Sois então o que esperava.» disse a jovem e fazendo um sinal de cauda. Ao que os outros mergulharam e desapareceram nas profundezas do mar.

 

«Meu nome é Paula.» disse a jovem. «Meus senhores dizem que me devo oferecer como refém a vós para nossos exércitos se dirigirem para Balad Naran.»

 

«Não necessito de uma refém.» disse David. «Mas aceitarei vossa ajuda em minha demanda.»

 

«Ajuda?» indagou Paula surpresa. «Que ajuda pode uma inimiga dar-vos?»

 

«Vossos talentos poderão ser de grande valia.» disse David.

 

«E vossos companheiros?» indagou ainda Paula.

 

«Acolhê-la-ão tal como eu.» disse David.

 

«Então serei vossa aliada nestes tempos tão estranhos.» disse Paula. «Mas não confio em vós e vós também não confiais em mim.»

 

«Se sabemos com o que contamos.» disse David. «Não serão surpresas que nos esperam.»

 

David pediu ainda a Paula para relatar ao seu povo o que deviam mostrar ao chegar a Balad Naran para que o rei os recebesse.

 

«Senhora.» disse ainda David. «Podeis subir a bordo ou ireis nadar ao seu lado?»

 

«Eu subirei.» disse Paula transformando-se numa forma totalmente humana embora pouco vestida. «Tereis de me arranjar roupas mais humanas.»

 

«Com certeza.» disse David cobrindo-a com sua capa. «Perdoai-me mas por ora tereis de vos contentar com minha capa.

 

E assim o primeiro herói do Caos juntou-se ao grupo.

 

No plano de existência dos deuses Rashagall via o primeiro movimento do Caos e a carta das Sereias movia-se para Balad Naran . Rashagall sorriu o seu plano resultara.