Capítulo 24
Menell, uma terra de grandes planícies silvadas. Uma terra onde pequenas colinas escondiam as subterrâneas habitações de seus habitantes. Os habitantes de Menell eram os Lepus. Um povo humanoide com capacidades sobre-humanas, fugidios e secretivos eram tidos como sendo de pouca confiança.
O grupo adentrou pelas planícies de Menell em busca do herói ou heroina desse reino.
«Vai ser difícil falar com alguém em Menell.» disse Bichana. «A maior parte do seu povo foge na presença de estrangeiros.»
«Que situação.» disse Andreia. «Mas de certeza que possuem um exército. Não deverão ser tão fáceis de conquistar.»
«Recebemos várias encomendas de armas.» disse Ana. «Isso indicaria uma presença militar.»
«Mas não quero provocar o exército de um reino apenas para falar com alguém.» disse David.
«Ainda bem que pensais assim.» disse uma voz feminina perto do grupo.
«Quem está aí?» perguntou a Tiago com a sua moca em riste.
«Calma Tiago.» disse André. «Baixai vossa arma.»
«Obrigado.» disse uma jovem morena, de olhos castanhos e sorriso divertido. «O meu nome é Ana Raquel e sou uma das defensoras de Menell.»
«Defensora?» riu Tiago. «E o que pode fazer uma rapariguinha como vós?»
A resposta veio na forma de uma salto de Ana Raquel. Enquanto no ar retirou a sua adaga Kriss da bainha e encostou-a ao pescoço de Tiago atirando-o do cavalo.
«Pode fazer-vos isto.» disse Ana Raquel séria.
«Estou rendido ás evidências.» disse Tiago a suar. «Sois uma digna defensora de vosso reino.»
«Ainda bem que achais isso.» disse Ana Raquel saindo de cima de Tiago. «Que situação.»
«Vós também?» riu-se Andreia. «Que situação.»
E com uma risada geral Ana Raquel juntou-se ao grupo e prosseguiram pelas planícies de Menell.
«Para onde iremos agora?» perguntou Soraia.
«Existem três reinos com fronteiras com Menell.» disse Ana Raquel. «Daric a Sul, A ilha de Askelon a Norte e a Oeste Okradon.»
«Será melhor irmos a Askelon primeiro.» disse Vanessa.
«Askelon?» indagou Carmen. «Esse é o reino das Górgonas.»
«É um reino que não gostaria de visitar.» disse Soraia.
«Por isso mesmo deve ser o primeiro a ser visitado.» disse Cristina. «Ficaremos logo sem esse problema.»
«Entendo.» disse Soraia. «Para Askelon então.»
O grupo dirigiu-se então para o mar interior que banhava a ilha das Górgonas, Askelon.
«Como é que chegamos á ilha?» indagou Serginho.
«Existe uma lenda que diz ter de se tocar uma trompa mágica. » disse Ana Raquel. «Trompa essa que só aparece quando se deseja ir até á ilha.»
«Como aquela?» perguntou Ganopa.
Perto das ondas encontrava-se uma árvore morta onde nos seus ramos se apoiava uma enorme trompa feita de um enorme corno.
«Podia jurar que não existia nada ali.» disse Cristina.
«É o que a lenda diz.» disse Ana Raquel.
«Então vamos a isto.» disse André agarrando na trompa.
E enchendo os pulmões André soprou na trompa. O som que ecoou pela costa parecia o lamento de algum monstro. Levantou-se então um nevoeiro no mar e o som de remos aproximava-se da costa. No nevoeiro recortava-se a silhueta de um grande navio. O navio foi tornando-se maior até atracar perto da costa. Da amurada veio uma prancha de embarque e uma figura de negro desceu pela prancha.
«É o capitão do navio.» disse Ana Raquel. «Teremos de pagar-lhe a viagem.»
«E o preço é?» perguntou Vanessa.
«Uma moeda.» disse Ana Raquel.
Todos retiraram uma moeda para pagar ao capitão. Ao chegarem à prancha de embarque encararam o capitão pela primeira vez. Era um esqueleto com um hábito negro. A sua mão aberta à espera do pagamento. Todos se aproximaram e colocaram a sua moeda na mão do capitão e embarcaram.
O convés estava seco, algo não esperado com tal nevoeiro, mas o navio estava rodeado de nevoeiro excepto o seu interior e a proa onde se podia observar a ilha de Askelon.
Askelon com as suas costas rochosas que pareciam bocas a gritar para sempre num terror absoluto.
Não havia tripulação a bordo além do capitão, tudo se governava por artes mágicas. O capitão estava no timão governando o navio por águas calmas. O navio aproximou-se da costa e parecia não haver porto algum onde atracar um navio tão grande. O capitão manobrou o navio e diante deles ficou uma gruta com o desenho de Medusa a rainha das Górgonas.
O navio penetrou na escuridão e seguiu pelo que pareceu uma eternidade no escuro até sair para a luz novamente e aportar a uma pequena baía.
Todo o grupo desembarcou observados pelos olhos vazios do capitão. Já devia ter visto muitos outros chegar, mas quantos desses teriam partido dessa ilha? Isso não lhe era importante, ele era apenas quem transportava, quem quisesse ir á ilha e nada mais.
O grupo subiu os degraus até ao topo da ilha. Durante a subida encontraram restos de membros e armas pelas escadas.
«As Górgonas não parecem gostar muito de estátuas.» disse Lina.
«Não conheceis muito sobre as Górgonas pois não?» perguntou Cátia.
«Que quereis dizer?» indagou Lina.
«As Górgonas tornam qualquer coisa em pedra com o olhar.» disse Cátia.
«Então isto eram...?» perguntou Vera.
«Exactamente.» disse Ana Raquel. «Se vos aparecer um Górgona nunca a olheis directamente nos olhos.»
Todos continuaram cautelosamente pelas ruínas dos templos e habitações e de várias estátuas partidas.
«Parai estrangeiros.» disseram uns olhos distantes e brilhantes na escuridão de um edifício.
«Sou David, príncipe de Balad Naran.» disse David.
«Sois esperado Príncipe David.» disseram os olhos. «Sigai a luz dos meus olhos.»
David seguiu sozinho pela escuridão atrás dos olhos brilhantes até uma grande sala repleta de estátuas.
«Bem vindo David de Balad Naran.» disse uma voz tão terrível como um demónio e tão antiga como o tempo. «O meu nome é Medusa, rainha das Górgonas.»
«Obrigado majestade.» disse David com uma vénia respeitosa.
«Gostais da decoração de minha sala?» indagou Medusa. «Pareceis procurar alguém entre os meus trofeus.»
«Procurava um conterrâneo meu.» disse David.
«De facto não sois o primeiro filho de Balad Naran a pisar nesta sala.» disse Medusa.
«Então António esteve aqui.» disse David.
«Sim.» disse Medusa. «Por minha escolha.»
«Sua, majestade?» indagou David surpreendido.
«Sim.» disse Medusa sorrindo como se relembrasse tudo de novo. «Quando me apercebi do que se estava a passar e a da missão que empreenderíeis, decidi que a escolhida de Askelon deveria saber tudo o que pudesse sobre o mundo do Oriente e quem melhor que António para isso.»
«E quem é a escolhida de Askelon?» perguntou David.
«A minha filha Rute.» disse Medusa.
«E António foi seu professor?» indagou David.
«Sim.» disse Medusa. «Ordenei que ele me fosse trazido e em troca da minha ajuda ele aceitou ser o professor de minha filha.»
«Ajuda?» perguntou ainda David.
«António precisava de transporte rápido para as terras mais a Ocidente.» disse Medusa. «Eu podia ajudá-lo nesse empreendimento. E antes que pergunteis também desconheço as suas razões.»
«E Rute está pronta a partir?» perguntou David.
«Espera este dia desde que António partiu.» disse Medusa. «Mas tenho de perdi-vos um favor príncipe.»
«E que favor é esse majestade?» indagou David.
«O poder total de minha filha não poderá ser libertado até que eu esteja incapaz ou morta.» disse Medusa.
«Majestade eu não posso matar-vos.» disse David aflito.
«Nem eu vos peço isso.» disse Medusa. «Ao fundo da sala encontra-se um espelho mágico. Apontai-o para mim, eu farei o resto.»
David encontrou o espelho e apontou-o na direcção de Medusa que olhando o espelho se tornou em pedra. David estava abismado. Medusa tinha o corpo abaixo da cintura de uma cobra, o torso de uma mulher e a cabeça coberta de serpentes.
«Então é assim que são as Górgonas.» disse David pensativo.
«Por aqui príncipe.» disseram os olhos familiares ao fundo de um corredor. «A princesa Rute espera-vos.»
David seguiu novamente os olhos até um jardim onde uma jovem o esperava.
«Sois Rute?» indagou David.
«Sim Príncipe David.» disse a jovem com uma ligeira vénia como faria qualquer jovem de Balad Naran.
David riu-se, riu a bandeiras despregadas ante a surpresa de Rute.
«Príncipe David?» perguntou Rute a medo.
«Desculpai-me Rute.» disse David parando de rir. «Eu conheço os métodos de ensino de António e de certeza que vos mostrou como fazer essa vénia.»
«Sim.» disse Rute começando a rir também. «Eu também me ri muito quendo ele me exemplificou a vénia.»
«Bem vinda ao grupo Rute.» disse David.
«Obrigada majestade.» disse Rute.
«Chamai-me apenas David.» disse David.
«Permitíeis-me uma pergunta David?» disse Rute preocupada.
«Digai Rute.» disse David.
«Que aconteceu a minha mãe?» indagou Rute. «E por favor não me mintais, eu senti o meu poder aumentar antes de vossa chegada.»
«Vossa mãe sacrificou-se para aumentar vosso poder até ao limite.» disse David cabisbaixo.
«Entendo.» disse Rute. «A minha mãe sempre me julgou demasiado imatura para entender o que se passava. Talvez antes de conhecer António assim fosse, mas cresci muito.
«Uma pergunta.» disse David.
«Claro.» disse Rute saindo do seu pensamento.
«Pensei que todas as Górgonas fossem como Medusa.» disse David.
«E somos.» disse Rute. «Medusa foi a primeira e a única que não poderia ter a forma humana novamente.
«Eis a minha resposta.» disse David satisfeito.
«Vinde.» disse Rute. «Iremos agora ter com os outros e cear.»
Rute levou David até um grande salão sem tecto onde todos se encontravam.
«Apresento-vos Rute, a nossa nova companheira de viagem e missão.» disse David.
A mesa onde estavam estava bem composta mas havia outra mesa á parte com outro banquete.
«Que faz tanta comida ali?» perguntou Cristina.
«É a refeição das harpias.» disse Rute. «Podeis vir pequenas, em nome de António vos ofereço o banquete.»
As harpias, seres meio mulheres meio pássaros desceram dos céus e atacaram o banquete como abutres.
«Porque haveis mencionado António?» perguntou Vanessa.
«As harpias comiam os restos que deixávamos após as nossas refeições.» disse Rute. «Mas António alimentava-as da sua própria refeição e tornou-se amigo delas. Elas farão o que for preciso se for pedido em nome dele.»
«Só mesmo o António.» disse Carmen.
«Depois da refeição partiremos.» disse Rute. «O capitão espera-nos.»
E assim o grupo voltou a Menell e partiu para a terra dos Hawks, Okradon.