Capítulo 4

O últimos dias de Vulkir tinham sido de grande terror. Tudo começara com a chegada de refugiados em pânico gritando loucuras de Arcanjos erguendo as suas espadas contra os povos que os adoravam. Embora Vulkir fosse mais associado a Artanis, Rashagall era tida em grande consideração e os seus exércitos tidos como grandes protectores desde que as sagas dos heróis eram cantadas.

 

Nas suas cidades fortificadas, os exércitos de Vulkir prepararam-se para o assalto iminente, embora no fundo esperassem que a batalha nunca viesse.

Mas inevitavelmente chegou. Com o nascer do sol, veio um brilho diferente, o brilho de um exércitos de Arcanjos.

 

Na cidade costeira de Pikarayo, Um jovem assumiu a defesa de sua cidade, Era alto como quase todos os do seu povo, os seus olhos claros mostravam vontade de viver, mas era o seu cabelo que mais o diferenciava dos outros de Vulkir, eram castanhos como o mel e não louros ou negros e mesmo ruivos eram mais comuns que o tom de cabelo do guerreiro de nome André. Era também um guerreiro audaz e poderoso, pois poucos eram os de Vulkir que ousavam empunhar o machado de guerra de dois gumes.

As defesas da cidade incluíam balistas copiadas de Kyra, mas aperfeiçoadas para o uso de arpões aos quais se podiam juntar vasos de fogo grego que tinham copiado dos Helénicos. Mas estas armas estavam mais preparadas para atacar navios e não Arcanjos.

 

«Poderemos aumentar o angulo de ataque das nossas balistas?» perguntou André a um dos seus compatriotas.

 

«Juntando uma nova armação, até as podemos fazer rodar.» disse o velho sorrindo.

 

«De quanto tempo precisam?» perguntou André.

 

«Estão prontas.» disse o velho com orgulho. «Sempre foi um dos meus passatempos melhorar aquelas armas.»

 

«Então apliquem-nas em todas as balistas.» disse André. «Meu senhor possivelmente salvaste Pikarayo de uma queda humilhante.»

 

E quase de imediato as novas armações foram instaladas e as balistas que sempre apontaram para o mar apontavam agora para os céus.

 

E então veio o primeiro ataque e os Arcanjos foram recebidos por salvas de flechas e arpões e os exércitos de Rashagall conheciam pela primeira vez a derrota. Mas isso não os impediu de tentar uma segunda e uma terceira e muitas depois dessas.

Mas as defesas de Pikarayo resistiram uma e outra vez ás investidas.

 

Durante as batalhas, André gritava ordens, corria a acudir as forças em perigo, e durante as pausas das batalhas visitava o povo e os refugiados para lhes incutir confiança e esperança. Essa era uma das razões porque as forças de Vulkir ainda resistiam.

 

«Meus irmãos e companheiros nestas batalhas.» disse André certa vez enquanto descansava á espera de nova batalha. «As forças que estão em Pikarayo são pequenas porque nossos irmãos estão a fazer um raide ás forças das Trevas no Oeste.»

 

«E quando voltarão André?» perguntou uma mulher apavorada.

 

«Em breve.» disse André. «Mas até lá, manterei esta cidade e meu povo a salvo desta traição.»

 

O seu povo rejubilou com estas palavras e no coração de todos havia sempre a esperança de que seria em breve que chegariam os seus exércitos e que a sua cidade seria salva.

 

Enquanto Pikarayo e as outras cidades de Vulkir tentavam resistir á invasão celestial, os navios de Vulkir estavam na sua viagem de volta encontravam-se com o navio de Balad Naran a caminho das suas costas.

 

Nas ameias de Pikarayo, André estava de novo de pé vendo o campo de batalha. Esta podia ser a hora final da cidade pois as defesas estavam exaustas e as munições começavam a esgotar-se, sem reforços conseguiriam resistir a mais um ataque, talvez a dois.

 

«Vamos lá, meus bravos compatriotas!» gritou André erguendo o seu machado bem alto. «Por Vulkir! Por Pikarayo!»

 

«Por Vulkir! Por Pikarayo!» responderam as defesas da cidade como se de apenas um pulmão tivesse vindo o grito.

 

Então começou a batalha, feroz, sangrenta, homem contra anjo, o cheiro do sangue, as penas das asas arrancadas, o feroz mau cheiro do medo e da morte, tudo no mesmo local faziam de Pikarayo um verdadeiro inferno.

 

André corria de ameia em ameia, levando esperança e o seu machado aos defensores, mas após horas de luta começava a ficar cansado. Não só isso como duas das suas posições de balistas tinham sido silenciadas por falta de munições e duas mais caíam ante a força da investida dos Arcanjos de Rashagall.

Embora os esforços de André fossem dignos de um herói das sagas, o cansaço e e ferimentos começavam a atrasá-lo e o seu poderoso machado jorrando sangue dos seus gumes começava a pesar toneladas.

 

André sabia que perdera, os seus homens exaustos não conseguiam mais aguentar os ataques. E então no momento mais negro da batalha, quando toda a esperança parecia morrer e o peso do falhanço começava a tornar-se impossível de carregar, soou ao longe uma trombeta.

 

O som da batalha quase se silenciou enquanto os seus intervenientes olhavam para onde o som tinha provindo.

O coração dos defensores bateu mais forte ao verem as velas negras dos seus compatriotas entrarem no porto de Pikarayo.

 

Dos barcos saiu então uma onda de espadas, escudos , lanças e machados, uma onda selvagem de guerreiros em fúria que levaram o exército de Rashagall a uma retirada desordenada.

 

Exausto, sobre um joelho e apoiado ao seu machado André sorria. Tinha cumprido o prometido, defendera a sua cidade e o seu povo até ao retorno dos seus exércitos. Ele era, sem sombra de dúvida um herói cuja saga seria cantada pelos séculos que passariam.